sexta-feira, 1 de abril de 2011

Epifania

O trânsito para, um calor asfixiante, o suor escorre, minha mente não consegue se aquietar. Turbilhões de pensamentos percorrem minha cabeça. Sentimentos afloram e a inquietação ganha, não há como resistir. Ela é bem mais poderosa do que eu. Uma simples mortal eu sou, sem saída, sem recursos...
O que farei? Fui demitida...  Tanto me empenhei, mas foi em vão. A empresa precisava fazer cortes, contenção de despesas. Resolveram então, dispensar os mais novos da casa. Ah! Como eu sonhei com esta vaga! O trânsito anda um pouco, reparo no vendedor ambulante de água... Quantos iguais a ele não existem? Quantos se aventurando entre os carros tentando sobreviver, faça sol ou chuva? Lá estão eles... Mandada embora, eu? Sempre fui tão eficiente... Um menino me oferece balas, digo que não. Vê se pode! Fui despedida, estou angustiada, cheia de problemas, e ele vem me oferecer balinhas...
Diante de minha recusa, abaixa os olhos e se distancia. Fico olhando pelo espelho retrovisor, o menino se afastando. Um quadro se pinta... Por um minuto, acordo, desperto e me dou conta de quanto egoísta estava sendo... Poderia ter sido um pouco mais doce com aquele menino, que não deveria ter mais do que 6 ou 7 anos. Afinal de contas, sua realidade já era demasiadamente cruel...
Buzino, insisto. O menino olha, peço que volte com um aceno, e ele rapidamente está à minha janela:
- Oi, tia! Aquele “tia” ajuda o nó na minha garganta a se formar... Engasgada com o choro, digo que quero comprar toda a caixa de balas. O menino sem ação me olha, assustado, olhos grandes, tristes... Uma lágrima escorre pelo seu rostinho miúdo. Uma lágrima escorre também pelo meu. Dou a ele o dinheiro, pelo que ele agradece.
Os carros começam a buzinar, o trânsito flui. Lembro-me de um versículo da Bíblia que diz que aquele que pode fazer o bem e não faz, peca. Uma onda de satisfação, bem-estar, toma conta de mim. Sabe, o calor é o mesmo, o ambiente também, mas meu problema não é mais tão grande assim, diminuiu. Meus olhos se abriram, pude ver o que é infortúnio. E que eu, definitivamente, não estava mergulhada em um problema incontrolável, nem tão grave... Percebe? Aquele menino, tão pequeno, tão menino, será que ele consegue sonhar? Será que ele pensa em brincar? Será que ele tem brinquedos ou uma cama quentinha no inverno? Ah! Menino...
Agradeço a Deus, pois acordei! Meus olhos se abriram, as lentes caíram, a miopia teve fim, não doeu! Me sinto melhor, e com mais responsabilidade frente à sociedade. O trânsito anda...

Franciane Santana

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